Vigilância Ativa (Active Surveillance -AS) em Câncer de Próstata Localizado
Trata-se de uma nova modalidade de tratamento para câncer de próstata localizado que consiste em fazer o acompanhamento da doença ao longo do tempo, no intuito de tratar aqueles pacientes que realmente tenham necessidade e de acompanhar aqueles que não se beneficiarão de nenhum tratamento, já que nesses indivíduos o tratamento trará mais comorbidades(como incontinência urinária e disfunção erétil) do que benefício, mantendo qualidade de vida, apesar da doença.
É um método responsável por cerca de 30-35% dos tratamentos em países da Europa e da América do Norte, porém difícil de ser incorporado na nossa realidade, principalmente devido a preconceitos culturais que envolvem a palavra “câncer”, tão temida num passado pouco distante, com significado direto de morte, porém com mudanças importantes de conceitos e avanços de tratamentos no que tange a glândula prostática.
Um grande problema é o rastreamento para todos os pacientes, como preconizado atualmente. Se por um lado faremos mais diagnóstico de câncer de próstata(CaP), beneficiando determinados casos, por outro traremos angústia e sofrimento a determinados casos que não necessitariam do diagnóstico e muito menos do tratamento, trazendo consequências importantes e em alguns casos severas.
Dessa forma, discute-se um rastreamento inteligente ou risco-ajustável. Nessa ótica, preconiza-se o PSA basal aos 40 anos, idade essa onde quase não se encontra hiperplasia benigna, para que possamos estimar o risco de desenvolvimento de câncer prostático nos próximos 20 anos. Sabe-se que se o PSA encontra-se abaixo de 1ng/ml, esse indivíduo apresenta um risco de câncer nos próximos 20 anos em torno de 0,2%, ou seja, muito baixo e dessa forma justificando um acompanhamento com PSA e toque retal(TR) a cada 5 ou até 10 anos, como preconizado por recentes estudos. Se esse mesmo indivíduo apresentar em PSA entre 1 e 2,5 ng/ml, então esse deve realizar o exame preventivo prostático, numa frequência parecida com a atual (anual).
Outra discussão importante é com relação ao sistema de biópsia prostática atual. O método preconizado é o da sextante, com a coleta de 12 fragmentos em determinadas regiões da próstata, guiada por Ultrassom transretal(USTR). Esse método esta sendo amplamente discutido, pois apresenta falha em até 25-30% dos casos em diagnosticar o CaP, além de proporcionar um número de fragmentos desnecessários, aumentando o risco de infecção urinária, sangramento, sepse e até mesmo óbito. Atualmente discute-se o uso da Ressonância Magnética Multiparamétrica (RMM) de 1,5 tesla associado à biopsia guiada por USTR, no intuito de se localizar áreas suspeitas com maior afinidade, aumentando sua positividade, diminuindo o número de fragmentos e consequentemente as complicações inerentes ao procedimento.
Nesse momento, a RMM pode inclusive ter o papel fundamental de se evitar biópsias desnecessárias em alguns casos, com grande chance de acerto, evitando-se complicações. Porém, em casos onde a densidade do PSA (dPSA) seja maior que 0,15, indivíduos com história de CaP em parentes de 1º. Grau ou indivíduos afrodescendentes, a biópsia deve ser mandatória, apesar da RMM normal.
Portanto, quais seriam então os candidatos a AS em CaP? De acordo com as diretrizes do NCCN (National Comprehensive Cancer Network), os candidatos ideais seriam aqueles classificados em muito baixo risco ou baixo risco (www.nccn.org). O formato preconizado para AS é de acompanhamento clinico de 3-6 meses com PSA, TR 6-12 meses e Biópsia prostática a cada 12 meses; devemos encurtar esses prazos caso as condições clinicas assim exijam. Nesse aspecto, discute-se muito a necessidade de termos uma RMM antes da indicação deste método, para que não haja falha na classificação dos candidatos e para que essa sirva de base para o acompanhamento e comparação a posteriori em uma possível evolução da doença.
Baseados nesses critérios, acredita-se que cerca de 60-70% dos pacientes não necessitem de tratamento imediato e estima-se que com o incremento de mais biomarcadores no futuro, como o PCA-3 e o Ki67, a segurança do método vai cada vez mais ser ampliada.
Outra discussão importante é no sentido de quais pacientes em AS deveremos tratar. Pacientes com elevação do PSA, alto volume tumoral, inclusive em Grau de Gleason 3 e aqueles com mudança de grau (3à4) são os candidatos a abandonar o AS e serem tratados. Estudo canadense recente de acompanhamento de 1000 pacientes em AS, demonstra que 3% dos pacientes desenvolveram metástase ao longo do tempo e nesses pacientes aqueles que apresentavam escore de Gleason de 7(3+4), apresentaram pior prognóstico. É importante salientar que os indivíduos Gleason 7(4+3), não devem ser candidatos a AS e sim a tratamento imediato.
Outro estudo do JCO (Journal of Clinical Oncology) de 1298 pacientes em AS estudados por 15 anos, portanto acompanhamento de longo prazo, cerca de 57% necessitaram ser submetidos a algum tipo de tratamento e o retardo do tratamento dos pacientes mantidos em vigilância não aumentou o risco de morte relativo ao câncer. Por outro lado, 43% dos pacientes não precisaram ser tratados, diminuindo dessa forma o risco das complicações já descritas e mantendo qualidade de vida, apesar da doença. O índice de morte câncer-específica do presente estudo foi de 0,1%, ou seja, extremamente baixa.
Como conclusões:
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Os pacientes candidatos a AS necessitam de uma RMM basal, necessitando de novas biópsias caso haja alterações;
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O PSA mantém seu papel importante no acompanhamento do câncer de próstata, enquanto aguardamos a descoberta de novos biomarcadores;
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A genética pode ter papel fundamental na classificação de risco de desenvolvimento de metástases naqueles pacientes candidatos a AS.